Problemas E Soluções Na Manutenção De Motores
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Problemas E Soluções Na Manutenção De Motores
PROBLEMAS E SOLUÇÕES NA MANUTENÇÃO DE MOTORES DIESEL DE ALTA ROTAÇÃO CC(EN) André Luiz Braucks Vianna, MSc Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro E-mail: [email protected] RESUMO No início do século XXI, a otimização da manutenção de motores Diesel de alta rotação ainda é um desafio, em função da grande complexidade destas máquinas. Nesse contexto, a aplicação efetiva da filosofia de manutenção preditiva ainda é bastante incipiente, já que, embora promissoras do ponto de vista da redução potencial dos custos de manutenção, tanto a análise acústica como a análise de vibrações, que são as mais poderosas técnicas preditivas, ainda carecem, no caso dos motores Diesel, de estudos e pesquisas que as aprimorem a ponto de tornar sua utilização real tão eficaz como esperado. Por outro lado, a manutenção preventiva ainda é, na prática, a atividade que consome a maior parte do tempo nas oficinas de médio e grande porte, no mundo inteiro, dedicadas a motores Diesel, mas os elevados custos de mão-de-obra e, principalmente, de sobressalentes, tornam necessário minimizar estes custos para a otimização da manutenção. A absorção de técnicas de manutenção preditiva dentro de um plano de manutenção preventiva é uma possibilidade concreta de solução para a aparente oposição entre estas duas filosofias de manutenção, além de facilitar a quebra de paradigma em direção à aplicação futura da preditiva. A técnica preditiva de inspeção visual por boroscópio, por exemplo, pode ser utilizada para priorizar entre motores Diesel que necessitam sofrer manutenção preventiva. Isto é importante, por exemplo, quando não se deseja paralisar simultaneamente mais de um Navio cujos motores Diesel necessitem de manutenção preventiva, como ocorre por vezes na MB (Marinha do Brasil). Neste artigo será realizada uma análise qualitativa e quantitativa das técnicas de manutenção preventiva e preditiva aplicadas aos motores Diesel de alta rotação da MB. ABSTRACT In the beginning of the 21st century the optimization of high-speed Diesel engines’ maintenance is still challenging, because of the complexity of such machines. In this context, the effective application of productive maintenance is still incipient. It happens because the most powerful productive techniques, which are vibration and acoustic analyses, yet require study and research, in the case of Diesel engines, in order to achieve an actual, practical application as useful as expected from users. On the other hand, the preventive maintenance remains, in practice, as the most important activity carried out by medium and big size Diesel engines workshops all over the world. However, the high costs of labor and spare parts involved in this type of maintenance make it necessary to minimize such costs for maintenance optimization. The inclusion of productive techniques in a preventive maintenance plan is a possibility of solving the apparent opposition between these two types of maintenance. Also, it helps companies to get used to the productive maintenance. For instance, the technique of visual inspection through boroscopes may be used for selecting a Diesel engine to be submitted to a top overhaul. This is important when it is not possible or convenient to stop more than one ship whose engines need to be overhauled, as it happens sometimes in Brazilian Navy. In this paper, both qualitative and quantitative analyses will be carried out for preventive and productive maintenance of high-speed Diesel engines used by Brazilian Navy. 1. INTRODUÇÃO – TIPOS DE MANUTENÇÃO Embora alguns autores (Kardec et al, 2002) reconheçam a existência de até seis tipos básicos de manutenção, os tipos mais comumente usados – e comparados entre si – são apenas três: a manutenção corretiva, a preventiva e a preditiva. Na corretiva, a máquina é simplesmente posta a funcionar até que ocorra uma falha que interrompa seu funcionamento. Este tipo de manutenção é adequado a situações em que existam máquinas duplicadas para um mesmo processo. Neste caso, a perda de uma máquina durante a sua parada para a manutenção corretiva não é significativa, podendo-se utilizar as máquinas sobressalentes em substituição à defeituosa. Os Navios da Marinha do Brasil (MB), como os de outras marinhas, muitas vezes possuem suas instalações de propulsão e geração de energia baseadas em motores Diesel e dotadas de duplicidade, redundância que permitiria, numa análise superficial, concluir pela adequação da manutenção corretiva. Contudo, a elevada confiabilidade que se espera de um navio de guerra faz com que a manutenção corretiva não seja adequada neste caso. A manutenção preventiva é realizada a intervalos fixos, que evidentemente devem ser menores que o TMEF (tempo médio entre falhas). Este tipo de manutenção é aplicado a situações em que a interrupção de uma máquina para uma manutenção não prevista (isto é, a manutenção corretiva) implica em prejuízo ou inconveniência. A manutenção preventiva não só é adequada aos motores Diesel utilizados na MB, garantindo a confiabilidade necessária para os mesmos, como também é efetivamente o tipo de manutenção mais utilizado, tanto nos motores de propulsão como nos de geração de energia. Já a manutenção preditiva é mais sofisticada que as anteriores, conforme Vianna (2004), sendo realizada exatamente quando necessário, nem antes nem depois. Para que isto seja possível, pressupõe-se o acompanhamento constante das condições de funcionamento das máquinas, o que é conseguido pela utilização de sensores apropriados (tais como acelerômetros, termômetros e transdutores de pressão) e sistemas de processamento de sinais (tais como microcomputadores). O processamento dos sinais para aplicação da manutenção preditiva a motores Diesel ainda carece de aperfeiçoamento, como será visto mais adiante, mas a Tabela 1, que compara os custos anuais dos tipos de manutenção, adaptada de Kardec et al (2002), mostra que a preditiva ainda é o “ideal a alcançar”, pois requer também uma quebra de paradigma para sua aplicação. Assim, a manutenção corretiva pode ter um custo anual superior ao dobro do custo anual de um bom sistema de manutenção preditiva. Tabela 1 – Custos anuais dos três tipos de manutenção TIPO DE MANUTENÇÃO Corretiva Preventiva Preditiva CUSTO US$/HP/ANO 17 a 18 11 a 13 7a9 Finalizando este item, cabe observar que os tipos de manutenção apresentados não são totalmente estanques, já que um bom banco de dados, formado com certo tempo de aplicação da manutenção preventiva, é muito útil para a análise de tendências e para o estabelecimento do “momento certo de atuar na máquina”, essência da preditiva. 2. APLICAÇÃO DA MANUTENÇÃO PREDITIVA A MOTORES DIESEL Existem diversas técnicas (Kardec et al, 2002) que permitem a aplicação da Manutenção Preditiva a máquinas e equipamentos. Destas, as mais apropriadas aos motores Diesel são a inspeção visual, a análise de óleo lubrificante, a análise acústica e a análise de vibrações. 2.1 Inspeção visual É uma técnica bastante útil, por permitir a avaliação direta de importantes partes móveis dos motores, tais como os pistões e as camisas de cilindro. Sua vantagem é que, com a utilização do boroscópio, a inspeção do motor pode ser feita com uma desmontagem apenas parcial (normalmente basta retirar as válvulas de injeção para a introdução do instrumento), o que representa economia de sobressalentes e mão-de-obra em relação às inspeções tradicionais, nas quais é necessário retirar, no mínimo, o(s) cabeçote(s). A desvantagem é que a inspeção com boroscópio não pode ser feita com o motor em movimento. Além disso, os melhores resultados desta técnica só são obtidos quando aplicada por profissionais experientes. 2.2 Análise do Óleo Lubrificante Consiste em levantar as principais características físico-químicas do óleo lubrificante do motor, tais como viscosidade, acidez total e basicidade total, e também a concentração de partículas metálicas presentes no óleo. A vantagem desta técnica é fornecer informações que não podem ser obtidas por outras, tais como uma possível contaminação do óleo lubrificante do motor por água ou combustível, ou ainda um excessivo número de horas de uso do óleo, traduzido pelo aumento de acidez total (TAN -Total Acid Number) e pela redução da basicidade total (TBN – Total Base Number), uma vez que, com o motor em funcionamento, os aditivos básicos vão sendo consumidos na neutralização dos ácidos gerados durante a combustão. Outra vantagem da análise de óleo lubrificante em motores Diesel é permitir o conhecimento da concentração de metais porventura presentes no óleo, tais como ferro, estanho, magnésio, silício e outros. A principal desvantagem da análise de óleo lubrificante – além da demora na obtenção dos resultados da análise das amostras de óleo – é que os fabricantes (como por exemplo a alemã MTU, fabricante de motores Diesel de alta rotação dominante no mercado representado pela MB) normalmente não informam os valores máximos admissíveis da concentração de partículas metálicas no óleo, o que dificulta a implementação de Programas de Manutenção Preditiva. A razão da não-informação supracitada é comercial, já que as vendas de sobressalentes figuram entre as principais fontes de lucro dos fabricantes de motores, e a implementação de Programas de Manutenção Preditiva pode implicar na redução das vendas de sobressalentes a médio e longo prazos. Portanto, cabe ao próprio interessado formar, ao longo do tempo, bancos de dados que permitam determinar os valores máximos admissíveis, a partir de diversas análises espectrométricas de óleo lubrificante, realizadas para cada tipo de motor e aplicação. 2.3 Análise Acústica Consiste em monitorar a condição de funcionamento de um motor Diesel através da medição e processamento dos sinais acústicos emitidos pela máquina. A riqueza das informações a respeito das condições de funcionamento de um motor Diesel que podem ser obtidas a partir da análise acústica explica a grande quantidade de estudos e pesquisas hoje levados a cabo neste promissor campo de pesquisa. A análise acústica e a análise de vibrações, que será comentada a seguir, permitem não apenas identificar eventuais problemas nos motores Diesel, como também diagnosticá-los, isto é, apontar suas causas primárias, como falhas nos injetores de combustível, folgas excessivas em componentes, desbalanceamento e outros. Não obstante, em uma importante área de interesse deste estudo, que são os motores Diesel marítimos, ainda existem dificuldades práticas na aplicação da análise acústica, ligadas à influência acústica de outros motores ou equipamentos funcionando simultaneamente na mesma praça de máquinas e ao próprio posicionamento dos microfones. 2.4 Análise de Vibrações É a mais importante e tradicional técnica de manutenção preditiva. É intuitivo que a vibração excessiva representa um indício de mau funcionamento em qualquer máquina, e os motores Diesel não são exceção. A análise de vibrações é a técnica preditiva mais poderosa no caso dos motores Diesel, permitindo detectar e diagnosticar diversos tipos de problemas nos motores, tais como desbalanceamento, desalinhamento, desgaste (por aumento de folga) em engrenagens e mancais, defeitos nos calços, deficiências nos injetores de combustível e outros. Mas ainda existem obstáculos a superar na análise de vibrações em motores Diesel, tais como a escolha correta dos pontos de medição dos sinais; o custo dos sensores; as interferências, nos sinais vibratórios, do meio (outras máquinas e motores, estruturas, etc.); a implantação de uma estrutura gerencial que permita a correta utilização da técnica e o fato de que certos eventos, nos motores Diesel são, além de transientes, atenuados enquanto se propagam ao longo do motor, como é o caso típico da injeção de combustível. 3. APLICAÇÃO DA MANUTENÇÃO PREVENTIVA A MOTORES DIESEL Do item anterior, fica claro o enorme potencial da Manutenção Preditiva, também no caso dos motores Diesel, o que explica os importantes investimentos em estudos e pesquisas – especialmente nos casos das técnicas de análises acústica e de vibrações – em andamento nesta área, em diversas Universidades e centros de pesquisas no mundo inteiro. Existem também aplicações concretas e bem sucedidas da Manutenção Preditiva a motores Diesel, como é o caso da Marinha chilena, ora em estudo pela MB com o objetivo de adaptar o sistema em vigor naquele país às particularidades das nossas necessidades. Mas o fato é que, de acordo com estatísticas apresentadas no sítio do Ministério do Trabalho dos EUA na Internet, a Manutenção Preventiva continua sendo a atividade que consome a maior parte do tempo nas oficinas de médio e grande porte, no mundo inteiro, dedicadas a motores Diesel, como é o caso da Oficina de Motores do AMRJ (Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro). Portanto, apresentam vantajosa relação custo-benefício os estudos, como o apresentado a seguir, que propiciem a redução dos elevados custos de mão-de-obra e, principalmente, de sobressalentes envolvidos na aplicação da Manutenção Preventiva aos motores Diesel. 3.1 O conceito de manutenção dos fabricantes de motores Diesel Outro fato de grande relevância para a adequada manutenção dos motores Diesel é que os fabricantes dos motores utilizam efetivamente um conceito de manutenção para seus motores que é fundamentalmente baseado no conceito de Manutenção Preventiva. Um exemplo típico é a filosofia de manutenção preventiva da MTU, constante de sua publicação técnica (2006) a respeito do motor série V 4000. Desta forma, os avanços permitidos pela Manutenção Preditiva são bem-vindos, mas o que existe efetivamente, quando se adquire um motor Diesel (da mesma forma que ocorre na compra de um automóvel particular) é um plano de Manutenção Preventiva. A confiabilidade do motor Diesel é o resultado de diversas ações e decisões. E entre elas uma das mais importantes é o correto cumprimento do plano de manutenção preventiva. 3.2 Detalhamento do Conceito A maioria dos fabricantes de motores Diesel utiliza um conceito de manutenção preventiva para os equipamentos, baseado em trabalhos de complexidade crescente a serem realizados nos motores à medida em que aumenta seu número de horas de funcionamento, desde as simples trocas de óleo lubrificante e filtros até a revisão geral (“major overhaul”, chamada de revisão W6 nos motores MTU) no caso de alguns fabricantes, ou a completa substituição do motor, no caso de outros fabricantes, passando antes pela revisão parcial (“top overhaul”, chamada de revisão W5 nos motores MTU). Em geral, os trabalhos iniciais, de menor complexidade (revisões W1 a W4), podem ser realizados pelo próprio pessoal de bordo, enquanto as revisões parcial e geral, de maior complexidade, devem ser realizadas por uma oficina especializada em motores Diesel, que disponha de pessoal treinado, das ferramentas e equipamentos especiais adequados e da documentação técnica necessária para a correta realização dos trabalhos. Passa então a merecer consideração, na Manutenção Preventiva de Motores Diesel, a questão da disponibilidade de oficinas especializadas, além da mera questão de custos. Como dito anteriormente, a confiabilidade de um motor Diesel é o resultado de uma série de decisões e ações relativas à sua manutenção, as quais são implementadas em diversos momentos da vida útil do equipamento. Parece interessante, então, estudar a evolução da confiabilidade dos equipamentos ao longo de sua vida útil, a fim de se verificar que ações/decisões poderiam contribuir para o aumento de tal confiabilidade, dentro do contexto vigente, predominantemente marcado pelos Planos de Manutenção Preventiva pré-estabelecidos pelos fabricantes e pela escassez de recursos financeiros. 3.3 Teoria da Confiabilidade: A Taxa de Falha A taxa de falha h(t) – ver Hayter (1995) e Meeker e Escobar (1998), por exemplo – representa a chance de um componente ou equipamento, que não falhou até o tempo t, falhar repentinamente. Ela também é conhecida como função ou taxa de risco, sendo definida matematicamente como: f (t ) h( t ) = (1) 1 − F (t ) onde f(t) é a função de densidade probabilística do tempo T de falha do componente ou equipamento, e F(t) é função distribuição acumulativa de T, ou seja, F(t) = P(T≤ t). A Equação (1), acima, foi obtida da definição de h(t), em que se tem: P(t < T ≤ t + ∆t / T > t ) P(t < T ≤ t + ∆t ) h(t ) = lim ∆t → 0 = lim ∆t → 0 = ∆t P(T > t ). ∆t F (t + ∆t ) − F (t ) 1 F ' (t ) f (t ) = lim ∆t → 0 . = = ∆t 1 − F (t ) 1 − F (t ) 1 − F (t ) A taxa de falha em máquinas – incluindo os motores Diesel, conforme informado pela MTU, por exemplo, em sua circular (2003) No. 04-03/A01 – quando plotada em função do tempo, apresenta o aspecto de “banheira” ilustrado na figura abaixo. h(t) Mortalidade Infantil A Falhas Aleatórias B Falhas por Desgaste C t Figura 1 – Curva de taxa de falha com aspecto de “banheira” É interessante observar que a curva de mortalidade do ser humano também segue o aspecto de “banheira” apresentado acima. Inicialmente, na região A, correspondente à mortalidade infantil no ser humano, a taxa de falha é alta, em função das falhas na fabricação de peças ou na montagem de componentes, no caso de máquinas e motores Diesel, o mesmo ocorrendo com os defeitos congênitos no caso do ser humano. Porém, tendo resistido e atingido o tempo correspondente à região B, é relativamente baixa (e aproximadamente constante) a taxa de falha nesta parte média da curva, onde as falhas ocorrem em função de fenômenos aleatórios, como por exemplo a variação aleatória da tensão de alimentação de uma lâmpada, que pode vir a queimá-la. Finalmente, passado o tempo correspondente e atingida a parte C da curva, ocorrem falhas pelo desgaste natural das peças e componentes das máquinas, e também as mortes por velhice nos seres humanos, com uma taxa de falha crescente no tempo. Surge, então, a relevante questão: Que decisões podem ser tomadas, no caso específico da manutenção dos motores Diesel, de modo a aumentar a sua confiabilidade, dentro de cada um dos 3 períodos distintos de sua vida útil, em função da taxa de falha? 3.4 Parte A da curva de taxa de falha: A mortalidade infantil e as bancadas de testes de motores Diesel Alguns fabricantes de motores, levando em conta a relativamente alta taxa de falha no início da vida útil – devido, como já citado, a possíveis falhas na fabricação e montagem de componentes, erros em procedimentos de inspeção e outros – prevêem testes dos motores em uma bancada apropriada, logo após sua montagem, e antes da instalação a bordo. A vantagem destes testes é superar a parte A inicial da curva supracitada antes de sua efetiva utilização a bordo, a qual já começa na parte B da curva, onde a taxa de falha é relativamente baixa. Basicamente, são realizados, com os motores Diesel em bancada, dois tipos principais de testes. Inicialmente, o motor é submetido a um aumento lento e gradual de sua rotação e carga – processo chamado de amaciamento (running in) – até atingir a potência nominal. Posteriormente, é realizado um teste mais rigoroso, onde o motor é submetido a uma sobrecarga controlada (normalmente de 5 a 15% da potência nominal), determinada pelo fabricante, no processo chamado de testes de aceitação. Por sua importância, os testes de aceitação costumam ser acompanhados por um representante do cliente – tipicamente, o Chefe de Máquinas do Navio onde o motor será instalado, no caso da MB. Se o motor Diesel consegue superar estes testes, que demoram várias horas de funcionamento em diferentes condições de carga, uma boa confiabilidade está assegurada por um tempo considerável (correspondente à extensão da parte B da curva). Outra vantagem dos testes em bancada é permitir sanar com rapidez (devido à maior facilidade de acesso ao motor na bancada do que quando instalado a bordo) os pequenos problemas (normalmente, vazamentos e pequenos ajustes no sistema de combustível) que costumam aparecer nos motores em suas primeiras horas de funcionamento. O problema para uma oficina de motores Diesel que realiza revisão geral em motores – como é o caso da Oficina de Motores do AMRJ – é que seria extremamente custoso enviar os motores para teste nas instalações do fabricante, em função das distâncias envolvidas. Para motores MTU de submarinos, por exemplo, as instalações apropriadas só estariam disponíveis na Alemanha. E para motores PAXMAN, somente na Inglaterra. A decisão tomada pela MB há vários anos foi a de investir recursos que permitem hoje à bancada de testes da Oficina de Motores do AMRJ ser a única na América do Sul capacitada a testar motores MTU de submarinos, tendo testado com sucesso os motores do submarino argentino “Santa Cruz” e dos submarinos “Tamoio” e “Timbira” da MB. Além disso, a Oficina de Motores do AMRJ, de acordo com a decisão da MB de adaptar a sua bancada de testes (projetada para receber apenas motores MTU de navios de superfície) para testar o maior número possível de motores, já testou também com sucesso, após as modificações necessárias, motores das marcas PAXMAN, Cummins e Scania. 3.5 Partes B e C da curva de taxa de falha: Manutenção Preventiva e Confiabilidade Dentro da parte B da curva de “banheira” da taxa de falha é que são realizadas as revisões parciais (“top overhaul” ou W5 no caso dos motores MTU) dos motores Diesel, enquanto que as revisões gerais (“major overhaul” ou W6 no caso dos motores MTU) deveriam principiar logo após o início da parte C, sob pena de risco considerável de falha do motor antes da realização do plano de Manutenção Preventiva, o que o descaracterizaria totalmente, em favor da Manutenção Corretiva. Na prática, a questão concreta que se apresenta é: Haverá recursos para a realização das revisões W5, na parte B da curva já estudada, e das revisões W6 logo no início da parte C? Estes recursos são de vários tipos, desde a verba para a aquisição de sobressalentes até o tempo de mobilização do meio (Navio) cujo(s) motor(s) precisará(ão) parar em função da revisão, passando pela disponibilidade de uma oficina especializada para realizar os trabalhos, conforme mencionado anteriormente. A segunda questão concreta é: Caso os recursos supracitados não estejam disponíveis, como maximizar a confiabilidade dos motores, ou, correspondentemente, que decisões podem ser tomadas de forma a minimizar as taxas de falhas envolvidas? Nos 2 próximos itens serão apresentadas respostas plausíveis para esta questão. 4. REVISÃO PARCIAL W5 E CONFIABILIDADE No caso dos motores Diesel, sua complexidade e seu elevado número de partes móveis sujeitas a falhas por desgaste tornam necessária uma simplificação na modelagem, de forma a permitir um estudo quantitativo à luz da Teoria da Confiabilidade. Posteriormente, será verificado se as conclusões oriundas de tal modelagem levam a decisões que pareçam razoáveis e que conduzam ao objetivo de maximizar a confiabilidade dos motores Diesel em situações de escassez de recursos, com que a MB tem convivido já há vários anos. Neste ponto do presente estudo, serão realizadas as seguintes suposições, baseadas em experiência prática e também na literatura referenciada: • Dos componentes que limitam a vida útil de um motor Diesel, os mancais fixos figuram entre os mais importantes, não só por provocar freqüentemente, em caso de falha, avarias de grande monta nos motores, como também pela dificuldade de acesso a tais mancais, os quais normalmente só são substituídos nas revisões gerais W6. Daí a associação da vida útil dos mancais fixos com a própria vida útil do motor até sua revisão geral W6. Ressalta-se, mais uma vez, que esta é uma simplificação, com o intuito de responder a questão levantada no item anterior. É evidente que o motor Diesel como um todo deve ter sua confiabilidade modelada, a rigor, com associações em série e em paralelo das muitas partes que o compõem. Tal modelagem, porém, de enorme complexidade, foge do escopo deste estudo; e • Conforme sugerido por Meeker e Escobar (1998), a distribuição da vida útil dos mancais fixos de um motor Diesel pode ser modelada, de acordo com dados levantados em estudos anteriores, por uma distribuição Weibull. Esta suposição, além de razoável, de acordo com a fonte citada, é necessária para a quantificação necessária neste momento. Mais uma vez, cabe mencionar que a análise final dirá se as suposições feitas são razoáveis, com base nas conclusões a que conduzirem. Supondo que a vida útil dos mancais fixos de um motor Diesel é modelada por uma distribuição Weibull, então sua confiabilidade r(t) será, conforme Hayter (1995): r ( t ) = e − ( λ .t ) onde a é o chamado parâmetro de forma da distribuição e λ é o fator de escala. a (2) Assumindo para esta aplicação, de acordo com Meeker e Escobar (1998), o parâmetro de forma a = 2,3, pode-se comparar objetivamente a confiabilidade de 2 motores Diesel na região B da curva de taxa de falha, e que estão em momentos de sua vida útil nos quais é necessário realizar a revisão parcial W5. Porém, tal como ocorre freqüentemente na prática, não há recursos ou não é conveniente realizar a revisão parcial nos 2 motores, mas sim em apenas 1. Como a Teoria da Confiabilidade pode auxiliar na decisão de qual motor submeter à revisão W5 neste caso? Um exemplo numérico razoável, de acordo com a experiência anterior, é apresentado a seguir. Um motor apresenta tempo de vida t1 = 0,5 . TMEF, onde TMEF é o tempo médio entre falhas (ou seja, a vida útil do motor) e o outro motor apresenta tempo de vida 50% maior do que o primeiro, ou seja, t2 = 1,5 . t1 = 0,75 . TMEF. Então, a razão entre as confiabilidades dos dois motores é, a partir da Equação (2): 2 ,3 r ( t 2 ) e − ( λ .t 2 ) e − (1,5.λ .t1 ) = = = e −1,54.( λ .t1 ) a a r (t1 ) e − ( λ .t1 ) e − ( λ .t 1 ) a a (3) Porém, a partir da definição da média de uma distribuição Weibull – ver Hayter (1995) – tem-se: 1 Γ(1 + 1 a ) (4) onde Γ é a função gama. Portanto, desenvolvendo a Equação (4), tem-se: λ.TMEF = 2.λ. t1 = Γ(1 + 1 a ) ⇒ λ. t1 = ½ . Γ(1 + 1 2,3) = 0,45. Aplicando-se λ. t1 = 0,45 na Equação (3), tem-se: TMEF = λ 2 ,3 r (t 2 ) = e −1,54.( λ .t1 ) = 0,78 r (t1 ) (5) Em resumo, um acréscimo de 50% no tempo de uso dos mancais implica numa perda de 22%, apenas, na sua confiabilidade, modelando de acordo com a distribuição Weibull. Este resultado reforça a convicção de que, dentro da região B da curva de “banheira” da taxa de falha dos motores Diesel, a variação de vida útil de 50% para 75% do TMEF (que corresponde, na prática, a milhares de horas de funcionamento do motor) não implica numa perda muito significativa na confiabilidade do motor. Então, para decidir, no exemplo em pauta, qual dos 2 motores faria a W5, num cenário de recursos escassos, parece mais razoável, de acordo com as condições apresentadas, utilizar outro parâmetro que não o tempo de vida útil, simplesmente. Recordando, da experiência prática e das técnicas de Manutenção Preditiva apresentadas anteriormente, que a inspeção boroscópica é uma técnica bastante útil no caso dos motores Diesel, parece razoável submeter os 2 motores a esta inspeção. A revisão W5 seria, então, realizada no motor em piores condições. De fato, um motor com mais tempo de vida, porém melhor mantido e conduzido, pode se apresentar até mesmo em melhores condições do que outro, mais novo, cuja manutenção não tenha sido realizada a contento. Resta agora uma última questão: E no caso da revisão W6, a situação da W5 se repete? Haverá ou não uma variação significativa da confiabilidade com o aumento da vida útil do motor, de acordo com a modelagem considerada? É o que será visto no próximo item. 5. REVISÃO GERAL W6 E CONFIABILIDADE A modelagem da confiabilidade dos mancais fixos do motor Diesel de acordo com a distribuição Weibull é similar àquela feita no item anterior. No entanto, como se trata, aqui, da revisão W6, onde a vida útil do motor está em sua fase final (parte C da curva de “banheira” da taxa de falha), existe uma diferença em relação à análise anterior. Será considerado aqui o exemplo hipotético – mas verossímil, dentro de um cenário de escassez de recursos, como o vivido pela MB já há vários anos – de 2 motores Diesel que, por razões diversas, não puderam ainda ser submetidos à revisão W6. Um motor apresenta vida útil t1 = TMEF e o outro motor já funcionou por muito mais horas, com t2 = 1,5.t1, tal como no caso anterior, de forma a facilitar uma posterior comparação de resultados. Dentro de um planejamento de Manutenção Preventiva sujeito, também, a restrições financeiras e de outros tipos, de forma que somente 1 destes 2 motores pode ser submetido à revisão geral W6, qual deve ser o motor escolhido? Como a Teoria da Confiabilidade pode auxiliar o planejamento prático da Manutenção Preventiva no caso da revisão geral W6 sujeita a restrições financeiras? Serão os resultados similares àqueles do estudo semelhante da revisão W5 realizado no item anterior? É o que veremos a seguir. Inicialmente, tem-se, da Equação (3), novamente: r ( t 2 ) e − ( λ .t 2 ) e − (1,5.λ .t1 ) −1,54.( λ .t1 ) 2 , 3 = = = e , já que a = 2,3 e t2 = 1,5.t1. Mas, agora, t1 = a r (t1 ) e − ( λ .t1 ) a e − ( λ .t 1 ) TMEF. a a Portanto, desenvolvendo a Equação (4), tem-se agora λ. t1 = 0,9. Substituindo este valor na equação acima, encontra-se, finalmente r (t2 ) = 0,30 r (t1 ) (6) O resultado indicado na Equação (6) é bem diferente daquele do item anterior, indicado na Equação (5). O mesmo acréscimo de 50% na vida útil do motor Diesel resultou, no caso da revisão W6, numa perda de nada menos do que 70% na confiabilidade dos mancais fixos, contra apenas 22% no caso anterior, da revisão W5. Este resultado está de acordo com o esperado da curva de “banheira” da taxa de falha dos motores Diesel na região C da curva. De fato, nesta região, a taxa de falha cresce rapidamente com o aumento da vida útil do motor, ao contrário do que ocorre na região B, relativa à revisão W5 e analisada anteriormente. Portanto, conclui-se que a modelagem da vida útil dos mancais fixos de um motor Diesel de acordo com a distribuição Weibull com parâmetro de forma a igual a 2,3 conduz a resultados coerentes com o esperado a partir da Teoria da Confiabilidade aplicada a motores Diesel e máquinas em geral, com a curva de taxa de falha em forma de “banheira”. Mais ainda, o resultado acima indica que, em caso de escassez de recursos para a realização da revisão geral W6 deve ser sempre priorizado o motor com mais horas de uso, ao contrário do indicado para a revisão parcial W5, onde uma inspeção boroscópica era relevante para a otimização do Plano de Manutenção Preventiva. De fato, deve ser lembrado aqui que a inspeção boroscópica, embora também possa ser realizada no caso de motores que devem ser submetidos a W6, não será capaz de avaliar os mancais fixos, em função de sua posição normalmente inacessível nos motores Diesel. E estes mancais representam um dos principais fatores limitantes da vida útil dos motores. Tem-se então, para as regiões A, B e C da curva de taxa de falha, o seguinte resumo de ações ligadas à manutenção de motores Diesel, ao longo de sua vida útil, oriundas de uma análise quantitativa realizada à luz de conceitos oriundos da Teoria da Confiabilidade: • Na região A da curva: Incrementar a realização de testes de bancadas nos motores Diesel após sua montagem, mesmo que para tais testes sejam necessários investimentos para a devida adaptação da bancada para receber os motores; • Na região B da curva: Caso não haja recursos disponíveis para realizar a revisão parcial W5 em todos os motores que estejam a ponto de realizá-la, priorizar o motor que estiver em piores condições, em função dos resultados a serem obtidos a partir de inspeções boroscópicas nos motores; e • Na região C da curva: No caso de motores que já tenham ultrapassado as horas da revisão geral W6, priorizar, no cenário de recursos limitados, a revisão geral para o motor que apresentar o maior número de horas de funcionamento. 6. CONCLUSÃO Existem ainda alguns obstáculos a superar até a plena aplicação prática da Manutenção Preditiva aos motores Diesel em geral. A Manutenção Preventiva ainda é a atividade que consome a maior parte do tempo das oficinas de médio e grande porte dedicadas aos motores Diesel no mundo inteiro. Não obstante, existe uma importante aplicação da combinação da técnica preditiva de inspeção visual por boroscópio com os planos tradicionais de Manutenção Preventiva. É quando não há recursos para se submeter à revisão parcial todos os motores que dela necessitariam, dentro da região B da curva de “banheira” de taxa de falha. Neste caso, deve-se priorizar a realização da revisão parcial no motor que apresentar piores condições, de acordo com a inspeção visual por boroscópio. Outras 2 decisões na manutenção de motores Diesel que aumentam sua confiabilidade ao longo da vida útil, nas regiões A e C da curva de taxa de falha, são citadas a seguir. Em primeiro lugar, na região A, é importante estimular a realização de testes de bancada nos motores, após sua montagem e antes da instalação a bordo (mesmo que sejam necessárias adaptações para permitir a realização dos testes). Finalmente, na região C, deve-se priorizar, no cenário de escassez de recursos, a revisão geral do motor com maior número de horas de funcionamento, independentemente das condições das peças passíveis de visualização com o boroscópio, em função da possibilidade de falha nos mancais fixos, normalmente inacessíveis para inspeção visual. 7. REFERÊNCIAS Hayter, Anthony (1995) Probability and Statistics for Engineers and Scientists, PWS, Boston. Kardec, Alan; Nascif, Júlio e Baroni, Tarcísio (2002) Gestão Estratégica e Técnicas Preditivas, Qualitymark, Rio de Janeiro. Meeker, William e Escobar, Luis (1998) Statistical Methods for Reliability Data John Wiley & Sons, New York. MTU (2003) Circular No. 04-03/A01 – Marine Applications – Relationship between Application Group, Engine Rating, Load Profile and TBO, Friedrichshafen, Alemanha. MTU (2006) Technical Publication – Diesel Engine V 4000 M50 A/B – Maintenance Schedule M050636/03E, Friedrichshafen, Alemanha. Vianna, André (2004) Relatório Final de Atividades – Disciplina COV 748 – Tópicos em Manutenção Preditiva, COPPE, UFRJ, Rio de Janeiro.